Das cocheiras do Stud Mário Rossano

Rio Volga 1

Hoje, 26 de maio, mais um mês da partida do pai. E, como havia escrito quando do primeiro ano abril passado, todos os dias 26 de cada mês uma história, um depoimento, uma foto, a memória estará presente e preservada não apenas para meus irmãos e eu. Também para os que gostam de turfe. Não haverá ordem cronológica nos posts. E sim, afeto, saudade, reconhecimento por tudo o que foi como homem e profissional.

Duelo 2

Na reprodução acima, quando venceu a primeira prova disputada do Hipódromo do Cristal em 21 de novembro de 1959. Sobre ela, colhemos do livro Dá-lhe Rossano! 25 anos sobre as patas dos cavalos, editado pelo meu irmão Mário Rozano, parte do depoimento do escritor, jornalista e radialista Davi Castiel Menda sobre a “carreira”:

“Passado algum tempo, em pleno dia da inauguração, instantes antes do primeiro páreo, ouvi um zunzunzum: quem largasse por dentro levaria vantagem. Motivo? A raia apresentava areia em demasia, à exceção da parte interna, bem mais compactada. Tratava-se de uma boa dica para quem pretendia apostar e acertar o primeiro páreo; era o sonho de todo turfista, entrar com o pé direito na história, na História do Cristal. Equivalia a esquecer – naquele momento único – como num passe de mágica, todos os reveses anteriores advindos do Moinhos de Vento. O mesmo valia para os profissionais inscritos no reduzido páreo de seis participantes. E quem largava na raia um, nesse primeiro páreo? Era o Duelo, dono de um retrospecto desolador, a ponto de os cronistas do Correio do Povo informarem laconicamente nos prognósticos: “Não cremos”. Esqueciam que Duelo seria conduzido pelo Mário Rossano, o que alterava a situação. O handicap passava a ser altamente favorável, compensando os fracos desempenhos anteriores do seu pilotado. Já na largada, Rossano posicionou-se francamente em primeiro, não concedendo a menor chance à Anfíbia (J. Cesar) e Soberbo (A. Reyna), os favoritos do páreo e, com sua tocada característica e magistral, ganhou de baliza a baliza. Mostrou e provou o excepcional jóquei que era. Além de merecidamente colocar seu nome na história, proporcionou, aos que acreditaram nele e no azarão Duelo, um lucro tão inesperado quanto elevado: um dividendo de C$ 147,00. Nunca meu bolso foi tão feliz. Toda a vez que lembro do evento, minha voz interior se exalta: Dá-lhe, Rossano! “

Em nossas conversas, sempre que falávamos das suas histórias, dizia a ele ser essa a maior vitória conquistada, a que mais significa o sentido da vida nesse universo do turfe sempre com as manchetes voltadas aos craques das corridas, e com razão. Mas, em verdade, quem dá todo um suporte à existência dos hipódromos são os cavalos comuns, aqueles que jamais cruzarão em primeiro lugar nenhum Grande Prêmio. Coube ao pai e a Duelo, um cavalo cuja perspectiva de vitória era apenas um sonho, vencerem a primeira corrida oficial do nosso maior hipódromo do sul do Brasil. Mais que um orgulho, uma homenagem que a própria história tornou realidade àqueles que trabalham incansavelmente e vivem para e pelo turfe. Obrigado, pai.

(Como gostaria de estar ouvindo o “mais outro desses modernos!” E um agradecimento que nasce e cresce com a alma aos amigos do Los Pingos de Todos, dos maiores sites de turfe da América do Sul e do não menos importante Todo a Ganador. Ao Marcelo Febula, Gustavo Lopecito e Pablo Gallo o meu abraço sempre.

Los Pingos de Todos

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Por vezes, como agora, continuo em 1961. A diferença traduzida em 53 anos, não me tornou em 2014 um turfista da nata. Bem que o pai fez de tudo para que eu me tornasse. E o quanto o acompanhei, em especial como treinador, não se faz presente além das lembranças e das palavras. Inesquecíveis. O Mário, meu irmão mais velho, não, ele seguiu e segue com brilho esse caminho. Ou seria por essas raias da nossa América? E com ele, os amigos que também estão se tornando meus amigos: Marcelo Fébula, Pablo Gallo, Marco Oliveira. Amigos maiúsculos, pela presença. E Gustavo Lopecito López, a quem apenas a geografia impõe a ausência do abraço. Amigo.

O Mário, lá com o seu http://www.mariorozanodeturfeumpouco.blogspot.com, o Marcelo e seus textos que penetram fundo (Un retrato al óleo em el Bar El Chino é algo fantástico) no http://www.lospingos.com.ar, o Pablo e sua profundidade no Todo a Ganador e o Marco, Historiador não permite que a gente deixe para trás a memória dos nossos hipódromos e seus protagonistas no Jornal do Turfe. E o Gustavo, me acolhendo com muita sensibilidade nos Pingos, espaço nobre que não mereço. Entre os amigos sou quase um penetra, filho de jóquei e treinador, irmão de especialista em turfe, amigo de outros também especialistas. Sou exatamente o que sempre fui, um observador. Atento, porém observador.

Contar aqui toda a história do meu Bento inesquecível é desnecessária. Seus desdobramentos na vida real até abril passado também. A bem da verdade, toda a crônica é verdadeira, nenhuma palavra foi metáfora ou inventada. Ainda tenho guardadas as bolinhas de gude, apenas não sei mais quem era a Ouropombo ou qual seria a do Lord Chanel? Não sei responder. Sei apenas que estão em minha história de vida e pude compartilhar quando da 106ª Edição do GP Bento Gonçalves. E agora, com a tradução do Marcelo, ganha outras cores, e com a generosidade do Gustavo, ganha o mundo no Los Pingos de Todos. Não sei o que mais posso dizer, as palavras saem desencontradas, feito redemoinho intenso dentro de mim. Mas sei que todos vocês, são parte da minha história e fico feliz em ter essa consciência. Obrigado, Mário, Marcelo, Pablo, Marco e Gustavo por me devolverem meus sete anos e toda uma vida que não se encerrou no já distante 1961.

http://www.youtube.com/watch?v=G9RS2BkbqHw

 

Foto: Chronosfer