Bob Dylan:The cutting edge – 1965-1966

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O 12º volume da série Bootleg traz Bob Dylan em toda a sua genialidade. mais que isso, mostra o como transforma suas canções em canções nem sempre definitivas e o quanto persegue o que acredita ser o melhor em relação a cada uma das suas composições. The cutting edge abraça os anos 1965 e 66 e três discos: Bringing it all back home, Highway 61 revisited e Blonde on Blonde. Período fértil, cada álbum uma obra-prima. Dylan em sua melhor forma, sem concessões. As músicas foram trabalhadas à exaustão. Seja na forma, nas palavras, no ritmo ora acelerado ora mais lento, quase balada, e vai fazendo com quem ouve também mudar a sua sensação, o seu sentimento. De repente, pega-se uma dela, qualquer uma, ouve o take 1 e o take final, depois de várias “transformações” e ouve-se outra canção. E o que não surpreende, afinal falamos de Mr. Robert Zimmerman, é a sua capacidade inesgotável de criar. A caixa  é uma preciosidade, takes de uma mesma música se repetem e nunca é a mesma canção. Para ser ouvido com calma, sem pressa, e para quem quer conhecer cada modificação em músicas clássicas ou nem tão conhecidas assim do repertório do bardo Dylan.

 

The Band: The Last Waltz

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Rick Danko, Levon Helm, Garth Hudson, Richard Manuel e Robbie Robertson: The Band. Paul Butterfield, Bobby Charles, Eric Clapton, Neil Diamond, Bob Dylan, Ronnie Hawkins, Dr. John, Joni Mitchell, Van Morrison, Ringo Starr, Ron Wood, Neil Young, Muddy Waters, Jim Gordon, Emmylou Harris e The Staples: The Last Waltz. A despedida de uma banda que captou, ao acompanhar o bardo Dylan em muitos trabalhos, a essência de uma época. Possuía vida para muito além de Mr. Zimermann, Um grupo de músicos que deixariam os palcos para apenas gravar discos em estúdio. Fez-se o concerto. 1976. E o que era apenas uma reunião de adeus com dois convidados transformou-se em uma celebração. Martin Scorsese filmou. Levou-o às telas. Ainda que muitos integrantes do Band não tenham gostado, The Last Waltz é uma referência em filmagens de bandas de rock. Discos foram lançados. Entre eles, esse cuja capa está reproduzida acima. Não há muito o que dizer. Basta ler a lista de músicos e ouvir. Momentos inesquecíveis habitarão a sua memória musical afetiva.

Da leveza da vida pela música e suas harmonias para o domingo: Bob Dylan, Paul Simon, Crosby, Stills & Nash, Jeff Buckley, Pat Metheny & Paulinho Moska

A transversalidade da música com outras expressões e sensibilidades: o cinema, o rádio, o estúdio, o público, a densidade de um festival, a solidão do músico. E nós, cada um com seu jeito de ser, vivendo juntos essa leveza das harmonias em nossas vidas.

Tim Buckley, o folk/rock e o cool jazz harmônicos

Tim Buckley

Tim Buckley viveu pouco tempo. Aos 28 anos deixou para trás a vida e todo o talento, por vezes incompreendido, do seu folk/rock do início de sua carreira à maneira de Bob Dylan. Oouco depois, a sonoridade foi se transformando até chegar ao cool jazz, certamente influenciado por Miles Davis, no magnífico Happy Sad de 1969. Seu disco é uma profunda reflexão sobre o amor, lembranças, encontros, distantes avenidas em que as melodias vão também marcando encontro com sua sensibilidade. Seus trabalhos seguintes continuaram com as linhas do jazz porém, mais próximo do fim, retorna ao pop. O pai de Jeff Buckley, também partiu cedo, deixou um legado de harmonia e beleza a ser guardado bem fundo dentro de nós.

Foto capturada no site http://www.eameat.org

The Concert for Bangladesh

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Agosto de 1971. O tempo não parou. O que motivou o ex-beatle George Harrison e Ravi Shankar a reunirem milhares de pessoas em dois dias no Madison Square Garden, em Nova York, continua atual. Pior, continuamos iguais. Se lá no início dos setenta os shows foram organizados para aumentar os esforços internacionais de sensibilização e de alívio aos fundos para os refugiados do Paquistão Oriental (hoje Bangladesh ), na sequência da Guerra da Libertação de Bangladesh, muito relacionado com o genocídio praticado então, os noticiários dos dias de hoje não nos distancia dessas razões. O poço em que a humanidade entrou não tem fim. Suas consequências, alimentadas ano após ano, chega a um momento de esgotamento da capacidade de reconstituição dos valores humanos. Falta de esperança? Desânimo? Não. Apenas a triste e discernida consciência de que caminhamos para o caos dos caos, onde os tecidos da sociedade se desfazem seja por um bombardeio, seja pela intolerância, seja pela corrupção, seja pelo preconceito, seja pela impunidade, seja por um lista infindável de situações que nos aprisionam dentro de nós mesmos. O exemplo de Harrison contou com uma “pequena ajuda dos amigos” Ringo Starr, Eric Clapton, Bog Dylan, Leon Russell, Billy Preston, Badfinger, Jim Keltner, Klaus Voormann e Jesse Ed Davis entre vários outros. Assisto o documentário. Escuto o disco. A parte deste todo que é a humanidade precisa parar, voltar um pouco para dentro e então buscar respostas mais contundentes e sérias para a crise de …falta de humanidade que vivemos. Continuo com a ingenuidade da utopia a guiar meus passos. Acreditar que é possível mais que um objetivo é uma razão para viver. Concertos como o realizado por George Harrison apontam, simbolicamente, este caminho. Em 2015, falta apenas o primeiro passo.

The Notting Hillbillies & Mark Knopfler

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O escocês Mark Knopfler é muito mais que a guitarra do Dire Straits. Seus flertes com outros gêneros e trilhas sonoras o colocam como um músico que não descansa em apenas um gênero. Seus projetos apontam para a diversidade de sua criação como compositor e uma espécie de dom muito especial da forma de tocar seu instrumento. A banda The Notting Hillbillies tem acento country, perceptível em alguns trabalhos do Dire Straits, e ainda que uma formação passageira com objetivo beneficente, deixou marcas. Marcas com as digitais de Knopfler. O álbum Missing…Presumed Having a Good Time reuniu, além de Mark, Guy Fletcher nos teclados, Steve Phillips na guitarra, Brendan Croker também na guitarra e o baterista Ed Bicknell em 1990. Um trabalho coeso e único no sentido de ter sido apenas um único disco gravado, embora tenham se encontrado para a realização de shows anos mais tarde com outros membros, entre eles os teclados de Alan Clark. Knopfler já havia incursionado pelo country quando gravou Neck and Neck com Chet Atkins, e também em seus álbuns solos há uma tendência ao gênero, sem deixar de citar Emmylou Harris também e o bardo Bob Dylan. Há gravações dele com Dylan antológicas em alguns discos com Infidels  e Slow Train Coming. Em suas trilhas, as composições criam mais atmosferas inseridas ao enredo, sem perder de vista o virtuosismo do compositor. Local Hero e Cal mostram Mark em plena forma criativa. Na carreira solo, Sailing to Philadelphia, com as presenças de James Taylor e Van Morrison dão um quê muito especial. Contudo, é com os Hillbillies que sua performance é mais solta e sua guitarra parece flutuar. Há uma passagem, não desse disco, mas de uma coletânea feita com vários artistas – Music for Montserrat – em que apresenta Money for Nothing com Sting e Eric Clapton acompanhados por Orquestra em que todo o seu talento como instrumentista explode de tal forma que certa vez ao passar diante de uma loja de departamentos um aparelho de televisão reproduzia essa passagem e em seu redor havia uma multidão assistindo a suavidade da guitarra. Um momento esse sim único. Essas influências do rock, blues, folk e country fazem de Mark Knopfler um músico que pode sim alternar bons, maus e extraordinários momentos. Todo grande instrumentista e compositor passa por isso, e o escocês não é diferente. Escutá-lo é um sentimento. E por isso vale cada segundo de suas harmonias. Um pouco de Mark Knopfler abaixo.

George Harrison: beatle não beatle

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Escrever sobre os Beatles não é algo que tenha a pretensão ou mesmo invadir esse espaço tão rico e complexo que os quatro de Liverpool criaram. Até porque já há publicações, teses, e uma quantidade incrível de ensaios, artigos a respeito que eu, apenas um admirador, pouco ou nada tenho a meu favor para escrever. Nada impede, no entanto, que possa expressar minha escolha pelo beatle favorito: George Harrison. Talvez tenha sido ele o único que seguiu mesmo como integrante do grupo o seu próprio caminho. Dos quatro, a partir da sua dissolução em fins de 69 e início de 70, alçou o voo mais alto carreira solo. É verdade que de altos e baixos, sendo os baixos mais altos que se poderia desejar e os altos tão baixos que ficam por vezes submersos, tendo acima as obras de Lennon e McCartney. Com All Things Must Pass o primeiro da safra pós-Beatles colocou seu disco entre os maiores da história do rock. E as canções do álbum foram criadas na época em que era o guitarrista dos Beatles. Como cada um partiu para seus caminhos, logo ficou evidenciado, e hoje ainda mais, que Paul continua sendo beatle. Não poderia ser diferente. E não é crítica, ao contrário. John tinha a sua maneira de ver a vida e o mundo e a realidade, mas seus discos em geral, excluindo quem sabe Mind Games e Live in Toronto, de 69, com a Plastic Ono Band, com quem gravaria Imagine, produziu não muito além do que se esperava dele. Algumas composições brilhantes, e outras na média. Nada além, o que também não significa crítica. E Ringo, bom Ringo é Ringo e ponto. A química existia entre os quatro, solos nem tanto. Harrison partiu desde cedo para trajetória muito pessoal. Ousado, acredito ser ele o beatle mais ousado, já criara trabalhos experimentais, já se “misturara” com outros músicos como Eric Clapton, Ginger Baker, Bob Dylan. Não por acaso é dele a concepção do Concerto para Bangladesh, o primeiro a coletar fundos com objetivo social e humanitário. Suas composições já estavam amadurecidas. “Here comes the sun”, que fora gravada pelos Beatles, ganha um toque mágico com os violões de George e Pete Ham, esse do Badfinger. “Something”, era impressionante em suas linhas harmônicas que levou Frank Sinatra a tê-la em seu repertório e cometer a gafe e dizer que era da lavra de Lennon&McCartney. É no seu disco de estreia que revela em definitivo sua capacidade criativa e de encontros. Canções inesquecíveis e que soam mais que atuais. A bela “Behind that locked door”, a dylaniana “If not for you”, a Harrison “My sweet Lord”,  as sessões com uma gama infinita de artistas em um dos lados do álbum triplo no original não deixa a menor dúvida: George foi um beatle que não era beatle. Sua maneira simples e tranquila e inquietante introduziu a cítara, os solos marcantes do início ao fim de canções, a suavidade e a pegada das suas produções como “I need you”. Escrevo e no player George ocupa o espaço. Preciso mais? Sim, apertar a tecla do repeat.

The Hollies sing Bob Dylan

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Os anos sessenta, não canso de repetir, e quem aqui chega deve já estar cansado de ler, foram e ainda são anos extraordinários para as artes e outras revoluções não apenas na cultura, embora também tenha em seu delicado corpo marcas de tragédias como a Guerra do Vietnã. A invasão britânica nos Estados Unidos foi marcante. Ainda que os The Hollies não fossem um grupo que se possa pôr entre os melhores da época, foram, sem dúvida, inesquecíveis com suas harmonizações tanto melódicas como vocais, que tinham com base principal o trio Allan Clarke, Toni Hicks e Graham Nash. Trio para ninguém pôr defeito algum. Em meio a sucessos e fracassos, Nash parte para fazer parte de um dos maiores trios, depois quarteto, ou mesmo dupla, todos eles se alternando ao longo dos anos: Crosby, Stills, Nash & Young. De alguma forma, ao escutar os discos em que o trio Clarke. Nash e Hicks estão presentes fica muita clara a intenção e influência de Nash em tentar dar outra dimensão aos Hollies, o que não foi bem aceito pelos demais integrantes. Até que em 1969, ano coroado por Woodstock, e já sem Graham, é lançado o disco talvez mais controverso de sua carreira: The Hollies sing Dylan. Gravar canções do bardo não é novidade, ao longo do tempo Joan Baez, Bryan Ferry, The Byrds (magnífico), Judy Collins e até mesmo brasileiro Zé Ramalho ou canções perdidas entre faixas de álbuns de diversos artistas sempre estiveram presentes no universo musical dos mais variados gêneros. Talvez pelo desafio que é interpretar Dylan. Sei apenas que dias desses, como diz o compositor cearense Belchior, tirei “da parede da memória”, no caso, das gavetas da minha cedeteca, o disco do Hollies com canções do Dylan. Continua tão estranho quanto o escutei pela primeira vez já perdi a contas do anos. Polêmico pelos arranjos demasiados em orquestrações ou muito distantes do que desde sempre havíamos nos acostumado com Dylan. Não que se tenha que ser fiel o tempo todo, absolutamente não, é que não houve “química” entre ambos. A distância entre as harmonias dos Hollies aumentam ao se encontrarem com as de Mr. Zimmerman. Por certo, há passagens muito boas, a amplitude vocal de Clarke em vários momentos é precisa e dramática – está certo, às vezes soa exagerado – e os arranjos instrumentais compensam a falta de unidade que começa pelo repertório à falta da mencionada química. Entre os grandes momentos, “My back pages” se torna a melhor faixa da compilação, sem dúvida alguma e algumas intervenções instrumentais de Tony Hicks compensam o esforço dos Hollies de terem Dylan em seu repertório.
Se o disco é confuso e polêmico, vale por ter sido uma gravação espontânea e insólita dos Hollies que mesmo sem ter a presença de Nash fez um disco que até hoje pode-se falar como surpreendente. No entanto, fica a pergunta: como seria com Graham Nash? Jamais saberemos.

Bob Dylan sings Frank Sinatra classics

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Bob Dylan se permite o infinito. Não existe horizonte que o faça pensar que após a linha imaginária vem o abismo. Sempre foi um transgressor no seu melhor estilo ou rebelde ou capaz de eletrificar o folk mais tradicional e despertar a ira dos mais conservadores. Provocador ou não, o bardo Dylan é incansável. Pode estar em seu repertório uma canção de Pete Seeger ou Paul Simon, pode estar ao lado de George Harrison e estar sozinho com seu violão e harmônica. Pode ser tão imprevisível quanto pode ser quase comum. Não por acaso alguns de seus discos não tiveram o carimbo da crítica como obra-prima. Na verdade, Mr. Robert Allen Zimmerman não precisa. Basta ter algum material circulando para esgotar logo em seguida. Seu nome mais que nunca é sol em todas as 24 horas do dia. Com ele, não há noite em nossas horas.
Agora, chega com um trabalho de covers, que para ele não são covers e sim o desenterramento das canções interpretadas por Frank Sinatra. Shadows in the night é bem mais que um registro de dez das canções de “The Voice”.

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Gravar com orquestra, ajustar os músicos dela com os cinco da banda foi algo novo e dimensiona o que significa Dylan quando se propõe a fazer algo inesperado. Será que é tão inesperado assim? Dele, tudo se pode esperar. E sempre vem com ares de novo, inclusive o novo. Claro que Bob Dylan não é o primeiro a gravar standards da música americana. Bryan Ferry em 1999 incursionou por esse caminho com o belo As time goes by, aliás, o ex-Roxy também andou caminhando pelo universo de Dylan em Dylanesque, isso em 2007. Outro que pisou o mesmo chão dos clássicos foi Rod Stewart, que impulsionou mais uma vez sua carreira com a série The great american songbook muito bem aceita pelo público.
Porém, é com Bob Dylan que tudo acontece. É através dele que o sentido mais amplo de revolução musical nasce e cresce. Ele pode fazer isso. Ele é um incansável e fantástico instigador de mentes e ativa como ninguém os poros da sensibilidade. Basta escutar, por exemplo, “Autumn leaves”, “That Lucky old sun” ou “Stay witm me”. Mr. Zimmerman é o sol em seu estágio mais brilhante. A qualquer hora do dia.

http://www.bobdylan.com/us/news/new-album-shadows-night-out-feb-3

Foto Bob Dylan: William Claxton. Capa: capturada na Internet.