Rita Lee: Bossa´n Beatles ou Aqui, Ali, Em qualquer lugar

Rita Lee

A história de Rita Lee é a história de muitos de nós. Qualquer dicionário de música que a aponte. constará uma gama de gêneros e movimentos que abrangem décadas de coerência e sobretudo de inquietude criativa. E chegam então os anos sombrios dos sessenta e o Tropicalismo fustigando estética e conceitos. Os Mutantes resistem ao tempo não apenas por isso, mas porque realizaram obras que mexeram e mexem com o pensamento, com o imaginário das pessoas. Imagine isso tudo em plena ditadura militar. Depois, outros tantos e vários caminhos. Alguns, bem sucedidos, outros nem tanto. Porém, a assinatura Rita Lee tem peso e densidade suficientes para sempre recriar, reinventar. Até que um dia gravou um disco – 2001 – com músicas de ídolos de gerações e gerações: Beatles. Com toda a espécie de problemas possíveis, afinal Rita Lee em nada é convencional, muitas das versões para o português castigaram os executivos detentores do direitos das composições de Lennon&McCartney. Aparadas as arestas, os arranjos e produção de Roberto Carvalho criaram um álbum alicerçado na bossa nova. Um diferencial, muito embora sei lá quantas gravações pelo mundo adentro inovaram ou não a leitura dos Beatles. Até canto gregoriano, esse até não é sinônimo de menosprezo, ou em forma barroca, jazz, blues, e um sem número de outras possibilidades, o que apenas demonstra o quanto o quarteto de Liverpool revolucionou e ainda revoluciona. Então, Rita Lee. Bossa Nova em um repertório suave, envolvente, tranquilo e amoroso. Um disco que somente é quebrado deste compasso em ” I wanna hold your hand”, que ganhou forma de forró e a abertura, “A hard days night”, roçando o rock. Em “In my life”, seja em inglês ou em português, a voltagem emotiva aumenta, assim como “All my loving” desperta corações. Disco para ficar bem ao alcance das mão e do player.

Richie Havens & The Beatles

Richie

Hoje a utopia parece estar confinada a um passado que não existiu. Vive no imaginário, apenas como algo que habita o abstrato. Ainda que Woodstock tenha existido e Richie Havens marcasse presença. Folksinger, jeito de tocar diferente, entrou no cenário dos anos sessenta hipnotizando o público com sua voz rouca e intensa, seu jeito desprendido de ser. E não é demais lembrar: naqueles anos estavam no mesmo palco nomes como Joan Baez e Bob Dylan, para ficar somente com eles. Richie se destacou como intérprete. Gostava de canções de outros compositores, em especial as de folclore. Construiu uma carreira assim. Porém, inesquecível sua aparição estrelar no Festival de 1969. Sua calça branca coberta por uma túnica laranja imortalizou seu jeito de ser. Tocou à exaustão e ao final já quase sem versos para a última canção, lançou a palavra Freedom, que se constitui até hoje um mantra. E o público também hipnotizado gritava por liberdade. Seguiu a vida, gravou quase três dezenas de discos, sempre com a linha que definiu como sua. Um desses discos, Richie Havens sings Beatles and Dylan tornou-se um álbum único. Dos anos aoitenta, tem aquele cheiro e marca da década vivida em 60, toques rítmicos dos 80, e a voz rouca e instrumentais sensíveis, dando uma nova perspectiva às composições desses monstros sagrados da música.

Sings

É com a sua sensibilidade, primeiro em Woodstock e depois com os Beatles – deixo Dylan para outro dia – que Richie, partiu em abril de 2013, ilumina esse dia ainda de chuva e frio no sul do sul e alimenta o todo que nos faz parte da vida e do caminhar. ( a quarta canção abaixo “In My Life” é simplesmente extraordinária em todos os sentidos e significados)

Foto: Al Rubin

Roger McGuinn, o mago dos Byrds

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Roger MCGuinn, nascido James, depois Jim e finalmente Roger, sempre esteve à frente do seu tempo. O filho de Chicago trouxe à música a eletrificação, por exemplo, das canções acústicas de Bob Dylan e Pete Seeger. Com o The Byrds mexeu com estruturas que permaneciam latentes e avançou tanto nos vocais quanto nos arranjos ousados. Um grupo formado por Roger, Gene Clark, David Crosby, Chris Hillman e Michael Clarke jamais passaria em branco em um cenário onde já despontavam Beatles, Rolling Stones, Kinks, Yardbirds e já apareciam logo após Bee Gees, Cream, Pink Floyd e a lista aumentava a cada mês naqueles tempos. Isso é 1965, cinquenta anos atrás.  Arrisco a afirmar que os Byrds foram o embrião melhor acabado do que seria os acústicos Crosby, Stills, Nash & Young. Acompanhem as linhas de ambos, as harmonias, os vocais. Há um universo de semelhanças que a magia de McGuinn, que não participou do CSN&Y, parece estar presente e teve em Crosby o seu representante, ainda que David sempre teve personalidade própria. Como poucos souberam lidar com os gêneros: folk, country e o rock. Como poucos abriram espaços generosos para os que vinham e também para os que já estavam.  Roger McGuinn foi (é) um mago. Da sua guitarra e vocais a doçura de tempos ásperos. De tempos de transformações que receberam das texturas dos Byrds um sentido novo e de esperança. A lamentar que não foram adiante. Se dispersaram, seguiram outros caminhos, alguns partiram, e a vida seguiu. Outro dia assisti a um filme chamado The song onde Alan Powell é um compositor e cantor folk/country que a tantas do enredo canta Turn! Turn! Turn!, canção preferida da sua esposa. Nos créditos finais, ao fundo a mesma música é interpretada por Roger McGuinn e Emmylou Harris. A magia dos Byrds e de Roger. Hoje, passadas cinco décadas, não olho pelo espelho para ver o que está lá atrás, mas não posso negar que aqueles anos são a essência de um tempo que ainda tem que ser melhor compreendido ou talvez ainda deva ser vivido sem ser passado.