The Beatles: Eight days a week – The touring years

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O documentário dirigido por Ron Howard não cristaliza apenas as apresentações dos Beatles. Conta a história com o olhar mais amplo. A lente expande os sentidos. Para quem ainda possa imaginar que os quatro de Liverpool foram os reis do ye ye ye vai tropeçar nas cenas que a tela revela.  Howard abraça ano a ano até quase a banda se desfazer. E é através dessa passagem pelo tempo que são também feitas transformações pelo mundo, guerras sendo vividas, depoimentos pessoais que testemunham o quanto a música e o comportamento ou até mesmo apenas a presença de John, Paul, George e Ringo incidiram sobre todos que viveram aqueles tempos, quem sabe até hoje. E mostra o quanto, à época do sucesso, eram seres humanos como qualquer um de nós. Até o momento em que se inicia um processo de mudança entre eles e neles como grupo. Eternos, fica aqui o desejo que assistam, se ainda não o fizeram, The Beatles: Eight Days a Week – The Touring Years.

 

“Ace in the hole” : a film by Billy Wilder

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2016 tem sido um ano áspero. As perdas, infinitas, nunca acabam. Agora, neste dezembro, 7 passado Greg Lake, dia 8 os 36 anos da partida de John Lennon. o 9 chegou para ser celebrado: 100 anos de vida de Kirk Douglas. Não creio ser necessário escrever sobre sua biografia. O pai de Michael habita o nosso imaginário há décadas como um ator extraordinário, como sua atuação em Ace in the hole, no Brasil A montanha dos 7 abutres, dirigido por Billy Wilder e co-estrelado por Jan Sterling em 1951.

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História sobre o homem, a sociedade e a mídia. Repórter que vive o fracasso, faz parada em Albuquerque, Novo México, e busca no jornal local oportunidade de recomeçar a carreira. Tempos depois, sem sucesso, ao cobrir mais uma das matérias, para ele, sem interesse algum, descobre um caçador de tesouros indígenas soterrado em uma mina. A partir das conversas com a esposa e o pai de Leo Minosa (Richard Benedict) cria a sua história. Afinal, para Chuck Tatum o que vende são as más notícias. Ao adiar em alguns dias o resgate, a mão segura de Wilder revela a face múltipla e complexa do homem, da sociedade como um todo e sobretudo a capacidade de manipulação feita pela mídia. Do quanto as pessoas são enganadas e de como é forjada a notícia de acordo com o interesse econômico e avança na corrupção da autoridade policial do local, o povoado de Escudero. A montanha, um santuário dos índios, ao ser explorada assim como a esposa Lorraine, que estava abandonando o marido, cede ás pressões e fica para aproveitar o grande número de curiosos atraídos pelas manchetes dos jornais e assim faturar o que nunca ganhou em sua vida, são símbolos emblemáticos do poder exercido pela imprensa. Até que o desfecho acontece. Assista com atenção as imagens, os diálogos, busque a essência da mensagem e trace uma paralelo com os dias em que vivemos e se pergunte se algo mudou. Um filme marcante por tudo, e sobretudo, pelo centenário Kirk Douglas.

Soundtrack: Easy Rider

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Easy Rider, no Brasil Sem Destino, é um filme emblemático. Realizado em fins dos anos 60 por Peter Fonda, Dennis Hooper – seu diretor – e Terry Southern, conta a busca pela liberdade pessoal de seus personagens principais, que atravessam parte dos Estados Unidos em duas motocicletas. Mais que apenas centrar na figura de Fonda e Hooper e até mesmo Jack Nicholson, a história acende as luzes daquele período, em especial a contracultura, e lança questões mais que subliminares sobre as paisagens de um país seja no aspecto social seja no político e suas tensões como também frequenta o movimento hippie já em processo de decadência, as drogas e a vida em comunidade. Mais que um filme de uma época, ao traze-lo para os dias de hoje é assustadora a presença de pontos comuns com a realidade do mundo em que vivemos ou tentamos viver. Marca ainda profunda, Easy Rider não é apenas a realização de um sonho. Debruçar-se sobre seu interior é quem sabe abrir outras portas da percepção do agora. Também tem como alicerce uma trilha sonora extraordinária onde se revezam entre as faixas do disco The Byrds, Steppenwolf, Jimi Hendrix, Roger McGuinn e The Band entre outros. Um momento a ser visitado com profunda atenção.

 

Janis Joplin: Little girl blue – Original Motion Picture Soundtrack

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Um nome que povoa o imaginário dos anos sessenta até os dias de hoje. Um nome que viveu a vida com tanta e tamanha intensidade que partiu aos 27 anos, deixando várias outras vidas em cada canção que sua voz registrou com alma e coração. O documentário Little Girl Blue não permanece apenas na música. Vai além. Revela uma mulher doce, sensível, densa, poderosa, cheia de vida. E de tormentas. O filme de Amy Berg introduz cenas, fotos, reproduções raras e mostra Janis jovem e linda e talentosa. No filme, Cat Power a representa. Cada canção é vida e por ela e com ela seguimos com a mesma e intensa alma.

 

Chico – Artista Brasileiro

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Perdi a conta de quantas vezes assisti (e ouvi) a banda passar. Ou terá sido o contrário, que não assisti (e não ouvi) ? Não importa. O Chico faz parte da vida do brasileiro assim como o brasileiro faz parte da vida do Chico. Clichê terrível, eu sei, mas às vezes a verdade se encerra dentro dos clichês e deles não há jeito de sair. Comigo não foi diferente. Desde muito cedo, ainda sonhava em sair pelo mundo adentro e as sombras ofuscavam esse sonho adolescente. Certa feita, um show com grandes nomes da nossa mpb em clube desses anos passados, e lá estava Chico no palco com Elis, Quarteto em Cy, MPB4 e mais outros cujos nomes se escondem dentro do meu esquecimento. Eu, na plateia. “A Banda”. Pois é, os festivais, a repressão, a censura, as aulas do ginásio/científico, as ruas desertas, Fernando Pessoa e o rock. Chico – Artista Brasileiro pelo para mim é um ponto de reencontro com o tempo. Não, não é acerto de contas, não, absolutamente não. Longe disso. Antes, acredito ser a confirmação de muitas convicções que naqueles sombrios anos sessenta, virando para os setenta, se formaram em definitivo dentro de mim. O filme de Miguel Faria Jr é sensível a tudo o que se movimenta (ou) em torno de Chico Buarque. Desde a sua relação com o pai Sérgio Buarque de Holanda (Raízes do Brasil) e as relevações que vai abrindo espaço na tela seja sobre a sua vida pessoal, sobre a ditadura, o público, o ofício de compositor/cantor. Momento marcante: a literatura quebra o muro de Berlim que existia entre ele e o pai. E a consciência que hoje não pode fazer algo igual ou inferior ao que já fez. E muita música: Mart´nália, Adriana Calcanhotto, Maria Bethânia, Mônica Salmaso, Milton Nascimento, Carminho, deslumbrante em “Sabiá”, e mais outros tantos. Um filme sensível. Um filme que nos faz pensar. Um filme que nos deixa mais próximos de Chico seja como poeta, compositor, cronista, cantor, pessoa. Um filme que emociona. E além das lembranças e reflexões de uma época e outra épocas que vai sendo passada a limpo, também alicerça Chico como ser humano acima de tudo. Filme que mexe com o coração e alma. (E me fez reencontrar minha adolescência, em outros tempos.)

Suite Française: a film by Saul Dibb

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Passo os olhos pelas páginas quase em branco da minha memória e não encontro nada sobre o filme Suite Française. O que não significa que tenha percorrido o circuito comercial. E, por essas coisas do acaso, será?, o filme está em um desses sites para ser assistido. Assisti. O trio de atores que forma o núcleo central da narrativa é excepcional: Kristin Scott Thomas, Michelle Williams e Matthias Schoenaerts. O tema, a Segunda Guerra Mundial. Por mais recorrente que possa ser, há sempre um nervo latejando para que não se perca nas mesmas páginas em que minha memória vai aos poucos apagar. Paris em 1940 sendo bombardeada, a ida para Bussy, pequeno povoado ao centro da França, o jovem marido indo para o front, uma nova vida que se desespera pelos refugiados que chegam, e mais desespero com a chegada dos invasores alemães transformam a vida de Lucile. Viver com a sogra, Madame Anzhelier, é um peso a mais na jovem que não sabe o destino do marido. A chegada do Tenente Bruno Von Falk quebra essa rotina de dor e desesperança. As contradições e o viver entram no conflito, criando outro conflito: o humano. Entre os que sofrem toda a sorte da força inimiga e seus armamentos e sua pressão psicológica e aqueles que se rebelam ou apenas tentam sobreviver. Os horrores da guerra desfilam de maneira sutil, em outras mais ferozes. Todavia, é em Lucile e Bruno que se estabelece a relação humana. E é nessa perspectiva que o filme, por mais cruel que seja, se debruça. Da distância ao encontro é outra guerra. E a corda que os aproxima é a música. Suite Francesa, no Brasil, possui a densidade que o horror da guerra causa, seus traumas, as derrotas e as vitórias, e questiona, por certo, o lado humano de invadidos e invasores. O livro original de Irene Némirovsky, é um relato impiedoso do cotidiano do vilarejo invadido. Mais tarde, levada a Auschwitz, onde morreu em 1942. A linha tênue onde a ficção ingressa é logo quebrada pela realidade. A guerra sempre é devastadora. Porém, algo permanece entre os que vivem o drama, o terror, a esperança, a morte, a sobrevivência, a destruição: é possível descobrir um sentimento maior que muitas vezes não possível ou jamais é dito. Os manuscritos foram recuperados e depois de seis décadas a França estava revelada a partir de Bussy. Um rigoroso e vital relato sobre a vida. Sobre a guerra. E, sobretudo, sobre o amor. Hoje, quando todos os meios de comunicação passam a maior parte do seu tempo noticiando guerras e mais guerras, olhar para dentro de nós mesmos e ouvir “Suite Francesa”, apesar de toda a dor, é um alento.

The Band: The Last Waltz

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Rick Danko, Levon Helm, Garth Hudson, Richard Manuel e Robbie Robertson: The Band. Paul Butterfield, Bobby Charles, Eric Clapton, Neil Diamond, Bob Dylan, Ronnie Hawkins, Dr. John, Joni Mitchell, Van Morrison, Ringo Starr, Ron Wood, Neil Young, Muddy Waters, Jim Gordon, Emmylou Harris e The Staples: The Last Waltz. A despedida de uma banda que captou, ao acompanhar o bardo Dylan em muitos trabalhos, a essência de uma época. Possuía vida para muito além de Mr. Zimermann, Um grupo de músicos que deixariam os palcos para apenas gravar discos em estúdio. Fez-se o concerto. 1976. E o que era apenas uma reunião de adeus com dois convidados transformou-se em uma celebração. Martin Scorsese filmou. Levou-o às telas. Ainda que muitos integrantes do Band não tenham gostado, The Last Waltz é uma referência em filmagens de bandas de rock. Discos foram lançados. Entre eles, esse cuja capa está reproduzida acima. Não há muito o que dizer. Basta ler a lista de músicos e ouvir. Momentos inesquecíveis habitarão a sua memória musical afetiva.

Testament of Youth: a film by James Kent

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Aos dezessete anos os sonhos transbordam. Tal qual um tsunami, não têm medo dos obstáculos que os impeçam de avançar. Sonhos não destroem vidas, flutuam até um dia se tornarem realidade. Ou não. Como seria sonhar e viver em 1914? Ter exatos dezessete anos, nos meses que estavam quase ao alcance da 1ª Grande Guerra Mundial, para Vera Brittain (Alicia Vikander) era um universo de amizade e amor por Roland Leighton (Kit Harington). Testament of Youth, com a mão segura de James Kent, entra nesse mundo de Vera. A biografia da jovem que viveu os amargos anos em que durou o conflito bélico (1914/18) é reflexivo e atual. Pular dos sonhos para a realidade, penetrar em um universo onde a dor, a contagem do tempo pode ser de apenas segundos entre a vida e a morte, e a perda são os companheiros mais fiéis de um tempo sombrio é um envelhecimento da humanidade para o lado ainda mais sombrio que é capaz. O processo de amadurecimento da jovem Brittain, de seus irmãos e amigos são fotografias de hoje. Os anos e as formas de combate mudam. Os atos são os mesmos ou piores. Se em 1914 a tecnologia era absolutamente quase nada em relação aos dias de hoje, se os recursos médicos ainda eram limitados, se as armas mesmo mortais eram menos sofisticadas, a essência do ser humano continuou (e continua) sendo dominadora independente de época. A capacidade que possuímos para a paz parece se desfazer com a ambição pela conquista. E essa espécie de conquista não é catalogada como sonho. A narrativa é dolorosa e densa. Vai povoando a vida interior e exterior de Vera e dos personagens. Forja ainda mais seu caráter, sua personalidade, sua coragem. Seu humanismo. Traçar um paralelo com 2015 parece ser cruel. Não é. Basta um único olhar para dentro do que acontece em nossos dias para que nossas peles sintam a verdade queimar impiedosa sobre nossas consciências. Um filme pesado, concreto e sem muitas palavras. Para que possamos olhar a vida com discernimento e jamais deixarmos de sonhar.

I Am Sam: music from and inspired by the motion picture

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Inserir os Beatles em nossas vidas e cotidianos é muito simples. Eles estão sempre presentes, e sempre estarão. A sensação é de que passa ano entra ano eles são cada vez melhores. E qualquer trilha se não tiver um disco completo deles pelo menos uma ou duas canções estão na playlist. É inevitável. E muitos filmes e séries se valem do talento do quarteto inglês para criarem situações muitas vezes únicas em cenas ou de alegria ou de complexidade dramática. O filme I am Sam estrelado por Sean Penn e Michelle Pfeiffer (2001) tem em sua trilha sonora uma verdadeira coletânea dos Beatles. Dezenove músicas que muito mais que emoldurar o enredo se completam e ganham vida para além da tela. No roteiro, o diretor Jessie Nelson trabalha com o talento de Penn e Pfeiffer ao contar a história de Sam Dawson, um homem com atraso cognitivo que cria sua filha Lucy (Dakota Fanning) com a ajuda de seus amigos. O que até então era uma vida normal, chega ao fim quando Lucy completa sete anos e ultrapassa a capacidade intelectual do pai o que desperta a atenção da Assistência Social. O destino da menina, o orfanato, passa a ser decidido na Justiça, por força da advogada Rita Harrison que o defende até a decisão final. Aqui fica em aberto para quem desejar assistir ao filme. Além de uma trama sensível e sobretudo reflexiva, a trilha é magnífica. Um encontro de linguagens transformou o disco em um interessante painel sobre a obra dos Beatles através de arranjos e interpretações de diversos artistas de gêneros tão diferentes entre de si e dos próprios autores. A lista é significativa: Eddie Vedder (“You´ve got to hide your love away”), Nick Cave (“Let it be”, “Here comes the sun”), Bem Harper (“Strawberry fields forever”), Sheryl Crow (“Mother nature´s son”), Bem Folds (“Golden slumbers”), entre outros nomes de peso. Sem dúvida, um álbum entrelaçado ao roteiro, às interpretações dos atores e músicos engajados na proposta. Para se ter sempre por perto. Abaixo, o disco na íntegra.


Vida perde Manoel de Oliveira

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O coração do cineasta português Manoel de Oliveira parou de bater na manhã desta quinta-feira. Aos 106 anos de idade, e em plena atividade, a perda não é apenas para o cinema. É para o mundo da Cultura. De longa carreira, iniciada na década de trinta com Douro, Fauna Fluvial até os dias atuais sua produção ultrapassou aos 50 longas-metragens de ficção e documentários. Em dezembro passado, apresentou seu curta O velho do Restelo, quem sabe o último realizado sob a sua direção. Sua vida é um exemplo de inquietude, no seu melhor sentido, até chegar ao cinema e nele fixar suas raízes e estrear em 1942 com Aniki Bóbó e então passar a frequentar a gangorra do sucesso e do fracasso comercial. O reconhecimento tardou, e o mais importante, no entanto, chegou. Em 1985 ganha o Leão de Ouro de Veneza com O Sapato de Cetim e em Cannes, anos mais tarde, em 99, o prêmio do Júri por A Carta. Os anos noventa foram um marco em sua produção, que passaria a ser anual e a trabalhar com grandes nomes do cinema, entre eles John Malkovich e a eterna musa Catherine Deneuve. Abaixo, trailer de Um filme falado, de 2003, estrelado por ambos. Perdemos uma grande referência, ficamos um pouco mais órfãos.

Foto: http://www.dt.pt