O Simply Red é cria dos anos oitenta. Seu alicerce estava no vocal denso e soul de Mick Hucknall e uma instrumentalização para além do pop convencional. Picture Book é o seu primeiro álbum, considerado também o melhor dos que gravaram, e nele as baladas e o soul já estavam bem definidos e revelavam sua futura trajetória. Ainda que feita com altos e baixos, talvez mais baixos que altos, suas canções, em especial as baladas, ganharam corpo no mundo inteiro. É comum encontrar aqui e ali coletâneas com suas músicas mais românticas. A verdade é que o Red sempre teve em Hucknall seu caminho. Sua voz estava acima dos demais e assim seguiam alternando sucessos e críticas nada suaves. Como curiosidade, o guitarrista brasileiro, de Pelotas, Heitor TP integrou a banda por alguns anos e a gravação de aluns covers de sucesso. Um grupo que vale ouvir, a pegada é muito boa e os vocais são mesmo excelentes.
Hoje, mais um dia 26 no calendário, mais um dia que se avoluma em meus dias de saudade. A partida do pai mais que cumprir sua passagem entre nós, foi uma passagem de ensinamentos, de vida, de força, de gana, de esperança. E criar em cada momento, uma amizade que vai formando uma cadeia de outros tantos amigos. Assim, ele se tornou amigo do Marcelo Fébula. Por tantos motivos, entre eles, os cavalos de corrida, o tango, a milonga. Não foram muitos esses momentos, o início de sua partida já havia começado mesmo sem ainda saber, no entanto foi intenso. E é pelo Marcelo que fica hoje esse dia de saudade como um dia de fortalecer elos. Obrigado, Marcelo.
E também chega ao fim a passagem do Chronosfer. O tempo voa mais rápido que eu possa acompanhar e o sul que vive em mim me chama com urgência. A todos os que por aqui estão, para os que passam e seguem seus caminhos, deixo o meu mais fraterno abraço de muito obrigado pelos ensinamentos que acolhi e acolho com vida.
Troilo – Grela
Aquela plataforma giratória Wincofon, o popular “winco”, trabalhou com nós desde antes que eu nascesse até meus 12 anos, quando foi prestar serviços na casa de uma tia. Lembro olhar os seus movimentos maravilhado: o prato girando, um braço segurando os vinilos, outro se movimentando com precisão, e os discos caindo. Os chamados LP (longa duração) eram leves, caiam com suavidade e giravam a uma velocidade de 33 rpm. Mas os outros, os pesados e frágeis de 78 rpm, despenhavam-se com estrondo e demandavam ao winco seu máximo esforço. Entre a pilha de discos havia dois ou três daqueles velhos “78” do selo discográfico TK que tinham etiquetas de cores cinza, branco e preto. Eram os de Troilo – Grela. Sou um homem afortunado. As obras que gravaram estes dois gigantes da música argentina me acompanham desde menino. Conta a lenda que no ano 1952 se apresentava no atual teatro Presidente Alvear da Avenida Corrientes de Buenos Aires a comedia musical “El Patio de la Morocha”. Em uma das partes da obra, Aníbal Troilo com seu bandoneón encarnava a um dos pioneiros do tango: o “Tigre” Eduardo Arolas. Junto ao violonista Roberto Grela interpretava o tango de Arolas “La Cachila”. Na estreia, o público explodiu em uma ovação tão grande que tiveram que repetir o tema, o único que tinham ensaiado. Imediatamente o selo TK lhes sugeriu que gravaram. O duo original se completou com Edmundo Porteño Zaldívar em guitarrón (um violão de som mais grave) e Enrique “Kicho” Díaz em contrabaixo. A formação gravou 12 joias entre 1953 e 1955.
La cachila.Tango. Música de Eduardo Arolas, letra de Héctor Polito. Gravado em 1953.
Palomita blanca.Vals. Música de Anselmo Aieta, letra de Francisco García Jiménez. Gravado em 1953.
A Pedro Maffia.Tango. Música de Aníbal Troilo. Gravado em 1953.
Sobre el pucho.Tango. Música de Sebastián Piana, letra de José González Castillo. Gravado em 1953.
Diablito. Tango. Música de Pedro Maffia, letra de Ismael Aguilar e Gerónimo Martinelli Massa. Gravado em 1954.
Un placer.Vals. Música de Vicente Romero, letra de Andrés Caruso. Gravado em 1954.
La cumparsita.Tango. Música de Gerardo Matos Rodríguez, letra de Pascual Contursi e Enrique P. Maroni. Gravado em 1955.
Nunca tuvo novio.Tango. Música de Agustín Bardi, letra de Enrique Cadícamo. Gravado em 1955.
Mi refugio. Tango. Música de Juan Carlos Cobián, letra de Pedro Numa Córdoba. Gravado em 1955.
A la guardia nueva.Tango. Música de Aníbal Troilo. Gravado em 1955.
El abrojito.Tango. Música de Luis Bernstein, letra de Jesús Fernández Blanco. Gravado em 1955.
Taconeando.Tango. Música de Pedro Maffia, letra de José Horacio Staffolani. Gravado em 1955.
Em 1962 Eugenio Pro substitui a Kicho Díaz, Ernesto Báez a Edmundo Zaldívar, se adiciona o violão de Domingo Laine e a agrupação grava outros dez temas.
Nunca tuvo novio.Tango. Música de Agustín Bardi, letra de Enrique Cadícamo. Gravado em 03 de Maio de 1962.
Madame Ivonne.Tango. Música de Eduardo Pereyra, letra de Enrique Cadícamo. Gravado em 21 de Agosto de 1962.
La trampera.Milonga. Música de Aníbal Troilo. Gravado em 21 de Agosto de 1962.
Mi noche triste.Tango. Música de Samuel Castriota, letra de Pascual Contursi. Gravado em 21 de Agosto de 1962.
La Tablada.Tango. Música de Francisco Canaro. Gravado em 21 de Agosto de 1962.
Silbando.Tango. Música de Cátulo Castillo e Sebastián Piana, letra de José González Castillo. Gravado em 27 de Agosto de 1962.
La maleva.Tango. Música de Antonio Buglione, letra de Mario Pardo. Gravado em 27 de Agosto de 1962.
Ivette.Tango. Música de Julio Roca e Augusto Berto, letra de Pascual Contursi. Gravado em 27 de Agosto de 1962.
Pa’ que bailen los muchachos.Tango. Música de Aníbal Troilo, letra de Enrique Cadícamo. Gravado em 13 de Setembro de 1962.
Maipo.Tango. Música de Eduardo Arolas, letra de Gabriel Clausi. Gravado em 13 de Setembro de 1962.
Não é exagerado adjetivar de joias as gravações do primeiro período. A maioria desses doze registros pode ser incluído em qualquer antologia de música argentina de todos os tempos.
Os amigos podem encontrar cada uma destas obras no Youtube, aqui só deixo o link de duas (impressionantes), algumas fotografias e um vídeo que também é uma verdadeira joia testemunhal.
Fotos
1: etiqueta dos velhos discos de 78 rpm.
2: capa de uma das muitas reedições do material.
3: Aníbal Troilo e Roberto Grela.
4: Aníbal troilo no bandoneón, Roberto Grela no violão, Kicho Díaz no contrabaixo e Ernesto Báez no guitarrón(isso segundo os epígrafes da fotografia em muitos sites de Internet. Para mim não é Báez, é outro grande violonista, Héctor Ayala).
5: Aníbal Troilo e Edmundo Zaldívar.
6: Ernesto Báez no guitarrón, Eugenio Pro no contrabaixo, Roberto Grela no violão e Aníbal Troilo no bandoneón.
7: Zaldívar, Grela, Díaz e Troilo.
8: Roberto Grela e Aníbal Troilo ao lado do grande cantor Roberto “Polaco” Goyeneche.
9: Troilo, Pro, Grela e Báez acompanhando a outro grande cantor: “El Feo” ou “El Gaucho” Edmundo Rivero. (abaixo do título)
Video
Do filme Buenas Noches Buenos Aires (de 1964, com direção de Hugo del Carril), uma cena inesquecível: recriando uma reunião de música e dança dos tempos fundacionais do tango, Beba Bidart e Tito Lusiardo dançam a milonga “La Trampera” com acompanhamento musical de Aníbal Troilo e Roberto Grela (acho que o outro violão que se vê é Ernesto Báez).
Neil Young é mais que um músico que transita por gêneros com extrema naturalidade. Seus trabalhos são o espelho do homem que é. Earth não é revelador muito menos um trabalho que inove o que já fez ou foi feito, o que disse ou já foi dito. Apenas bate na tecla, que nunca deve ser deixada de ser tocada, das questões que envolvem a Terra, a natureza, o meio em que vivemos e os seres vivos em todas as suas espécimes. Aliado ao grupo Promise of the Real vai percorrendo esse caminho, misturando ao som dos instrumentos outros sons derivados dos outros mundos, em especial o animal ou mesmo do homem trabalhando a terra, o arado firme lavrando a vida. Nada de novo, porém o alerta, a atenção, a constante lembrança um dia fará que a consciência se volte à vida e possamos viver em paz e harmonia. Abaixo, dois momentos da mesma canção, “Mother Earth”.
Tal qual um fruto da época, fui colhido. Pela surpresa. Ao passar por alguns discos deste 2016 como Duas sanfonas e uma orquestra, do Kiko Horta e Marcelo Caldi, Mestrinho e Nicolas Krassik, sanfona e violino com os próprios, Nascente, com a harmônica do Grabriel Grossi e o violão 7 cordas de Félix Júnior, o violeiro Heraldo do Monte, o Encontros do Zé Nogueira, sax, e Arthur Dutra, vibrafone e outros mais, estava escondido entre um e outro o Between Worlds. A bela capa me chamou logo, e o nome tão estranho quanto o horizonte ao fundo. Bom, ao ler mais sobre Beth outra surpresa: cantora, pianista, compositora. Até aí, tudo tranquilo. O currículo me derrubou. O que participou e participa de shows, espetáculos, seja como intérprete seja como vocalista ou ainda como instrumentista dos maiores dos nossos artistas perde-se a conta de quantos. Beth Bruno, para resumir, esteve com Milton Nascimento em seu show Crooner, o que revela o quanto é talentosa a pianista. Já havia gravado outros discos, e agora chega com o magnífico Between Worlds. Música Popular Brasileira e Jazz se unem a voz suave e vai preenchendo os vazios que possam existir. Não sei bem o que escrever, basta ouvir para se sentir em paz. E ser colhido em definitivo por vários mundos de sensibilidade e beleza harmônica e vocal.
O escocês Donovan é um marco da psicodelia dos anos sessenta. Folk por natureza, entrou no cenário pop com sucesso e discos antológicos como Sunshine Superman em uma época em que os nomes do rock eram (e ainda são, eis que eternos) de peso. para ter uma pequena ideia, Jimmy Page tocou com ele em uma ou outra faixa de seus discos. Depois, enveredou por outros caminhos não muito felizes e se perdeu no tempo e no espaço. É lembrado por ter composto canções para a sensível trilha de Irmão Sol, Irmã Lua (1972, dirigido por Franco Zefirelli). Donovan ainda habita a vida de quem viveu esses anos inesquecíveis.
A Escandinávia sempre esteve presente em meu imaginário, em meus sonhos. Noruega, Finlândia, Dinamarca e Suécia alimentaram minha infância e juventude e agora ainda alimenta a maturidade. É da Dinamarca que chega a textura sonora do The Cabian Project. À frente duas cantoras sensíveis, Marie Fisker e Kira Skov, acompanhadas do sax, flauta e teclados de Ned Ferm e mais Oliver Hoiness na guitarra. mais que simples texturas, as tramas harmônicas desconhecem fronteiras e penetram, com segurança e naturalidade, no rock, no folk, no soul e jazz. Uma fusão etérea, profunda, em que os mares que cada letra contém nos remete a cenas da vida, da nossa vida. Nada excede ou é demasiado. Um alento permanente.
O argentino Lito Vitale é dono de uma obra musical extraordinária. Pianista clássico, soube mesclar com sensibilidade elementos do folclore, da música popular e do jazz ao seu estilo e criar um ambiente propício à sua sonoridade. Por vezes solo, outras em cuarteto ou quinteto, Vitale construiu texturas envolventes a cada trabalho realizado. Nasceram discos como La senda infinita, Ese amigo de alma, Juntando almas – nome de um programa televisivo que manteve em Buenos Aires, onde um convidado se apresentava e ele acompanhava ao piano, belo disco – e aparições com Juan Carlos Baglietto no fantástico No olvides, e em outras faixas de músicos argentinos seja como instrumentista ou produtor. La cruz del sur foi lançado no Brasil e tem pelo menos duas de suas mais belas canções: “Una nueva vida” e “Mi tierra más alla del mar”. nele, ainda acompanhado de Marcelo Torres, no baixo, Manuel Miranda no sax e flauta e Marcelo Novati na bateria. Um disco que vale cada harmonia e que abraça esse primeiro dia de inverno aqui nesse sul do sul brasileiro.
O rock contemporâneo – esses rótulos sempre me deixam agoniado! – sofreu com a perda de Ian Curtis. Figura emblemática do Joy Division, Curtis partiu demasiado cedo, deixando um legado revolucionário para a sonoridade da década de oitenta. Uma mescla que passava por Doors, Velvet Underground, experimentos eletrônicos, a bateria inquieta e impiedosa, a guitarra alucinante. Um resumo que junto às letras que prenunciavam sua morte causava o estranhamento que uma banda pudesse causar e fazer do Joy diferente naquele período de vida. Closer é tudo isso e mais um pouco ou muito mais. Mistério, capa premonitória, letras e som enigmáticos, os conceitos indo para o espaço e um imenso universo de possibilidades ao ouvi-lo. Talvez, agora já mais distante no tempo, possa esse disco ser o hoje no mundo. Quem sabe.
“Hallelujah” habita nosso imaginário. Leonard Cohen a conduz em cada harmonia e verso, que se multiplicam e se realimentam. É uma canção que nunca parece se esgotar. O canadense a incluiu no disco Various Positions de 1981 e desde então ganhou covers e arranjos que a dimensionam a um plano superior. Coletâneas em homenagem a Cohen como Leonard Cohen: I´m your man, I´m your fan e The songs of Leonard Cohen, o primeiro de um documentário sobre o compositor e cantor, já mostram a densidade de sua música. Hoje, um hino. Abaixo, algumas dessas leituras feitas, além das consagradas pelo próprio Leonard e a bela e quem sabe melhor de todas por Jeff Buckley. Mas, a lista contém Bob Dylan, John Cale, kd lang, Bon Jovi, Rufus Wainwright, Lindsey Stirling e muitos outros. Para esse domingo ficar mais rico e sensível.
Este Chronos sempre fica mais rico quando em seu cais portam as contribuições do amigo, jornalista, músico e turfista Marcelo Fébula. A cada mês, essas águas ficam mais azuis e serenas. Agora, desce suave o tango de um dos ícones da Argentina: Osvaldo Pugliese. A palavra é do Marcelo, o agradecimento, nosso.
Três tangos de Osvaldo Pugliese
Osvaldo Pedro Pugliese foi uma das figuras fundamentais da história do tango. Sua orquestra, um ponto de referencia permanente. Seu estilo, uma clara influência para outros grandes músicos, como Astor Piazzolla.
Alguns estudiosos falam da Trilogia Pugliese referindo-se as três composições talvez mais representativas desse estilo singular, verdadeiro ponto de inflexão na evolução do gênero. São elas La Yumba (gravada em 1946), Negracha (em 1948) e Malandraca (em 1949).
Minha proposta de hoje para os amigos é desfrutar destas criações de Dom Osvaldo.